As diferenças da atualidade face a 1985-1987
A AD sabe que não consegue cumprir o seu programa económico, porque ele é simplesmente improvável e esquece o contexto internacional. É uma equação de impossível solução
As eleições legislativas de 10 de março marcam um ponto de viragem da política portuguesa. Caminhamos em terrenos completamente desconhecidos, onde os quadros analíticos existentes não são suficientes. Qualquer tentativa de comparação histórica que se faça pode ser simplista, mas o PSD parece acreditar nos métodos do período de 1985 a 1987.
Não tenho memórias do primeiro Governo de Cavaco Silva. Tinha apenas 2 anos, em 1985, quando foi eleito primeiro-ministro. Em 1987, numas eleições legislativas antecipadas por uma moção de censura do PRD, o PSD chegou à maioria absoluta.
Portugal e o mundo mudaram muito desde essa data. Somos parte da União Europeia, da Zona Euro e do espaço Schengen e nestes quase quarenta anos consolidámos a Democracia, o desenvolvimento e transformámos o país. Ao comparar qualquer indicador estatístico de 2024 com 1985 percebemos a distância percorrida.
O enquadramento histórico já seria suficiente para compreendermos o erro do PSD. Mas, sinceramente, alguém acredita que o Chega é igual ao PRD? A figura de Ramalho Eanes não podia estar mais distante da de André Ventura e, dessa forma, a sua postura política não pode ser comparada. No maior partido da oposição, também não podemos comparar a liderança de Pedro Nuno Santos face a Vítor Constâncio. E Luís Montenegro não é Cavaco Silva.
Na tomada de posse, o primeiro-ministro mostrou a sua estratégia. Um discurso em torno da ameaça, da chantagem, da vitimização e do confronto. E onde, de forma simbólica, ressuscitou alguns dos piores conceitos do cavaquismo, as “forças de bloqueio” e o “deixem-me trabalhar.” A estratégia é a pressão sobre o PS. Luís Montenegro lidera o Governo e o PSD. Não lidera e não condiciona a oposição.
Fala-se de moderação. Eu, como um moderado, não posso deixar que seja um partido radical e populista a liderar a oposição. E é essa a grande responsabilidade do PS e do seu posicionamento parlamentar: não ser “muleta” de ninguém e liderar a oposição. Se queremos combater o populismo, temos que criar soluções para as necessidades das pessoas, é essa a resposta “olhos nos olhos” que devemos dar ao crescimento das forças extremistas.
Para dignificar a política é preciso cumprir os compromissos eleitorais. Os eleitores não aceitam desculpas. A AD apresentou-se a estas eleições com um cenário macroeconómico de crescimento irrealista e acima de todas as previsões. Sem esse crescimento, o resultado seria um desequilíbrio orçamental, face ao aumento da despesa permanente e à diminuição das receitas. A AD sabe que não consegue cumprir o seu programa económico, porque ele é simplesmente improvável e esquece o contexto internacional. É uma equação de impossível solução.
Naturalmente, já começaram estrategicamente a tentar desmistificar aquele que é o maior excedente orçamental da nossa democracia, mas a verdadeira razão é o seu programa económico. A AD necessita de desculpas para não cumprir os seus compromissos e, dessa forma, o Governo tenta a todo o custo copiar o período 1985-1987. Mas a História não se repete. E as diferenças estão à vista.
Fonte: Hugo Costa, Expresso, 11 de abril de 2024