Casimiro e Neeleman: descubra as diferenças
Em 2012 Miguel Relvas ligou ao amigo Alfredo Casimiro e propôs-lhe um negócio: ficar com a maioria do capital da empresa Groundforce. Não era possível a TAP ficar com a maioria do capital do handling num aeroporto que tinha mais de 50% de quota de mercado porque violava uma diretiva europeia. Mas o então ministro dos Assuntos Parlamentares facilitou a operação: “deu” a maioria do capital (50,01%) à Pasogal, empresa criada para o efeito por Alfredo Casimiro, que apenas ofereceu uma garantia bancária junto do Montepio.
Com zero euros o empresário passa a controlar a Groundforce. Mas não só. Ao mesmo tempo, recebe um contrato de gestão que permitiu ao empresário obter 1,5%/ano de receitas da Groundforce. Ou seja, Alfredo Casimiro não paga, e ainda recebe. Foram cerca de €7,6 milhões até 2017, altura em que a TAP rasga o contrato após envolvimento judicial. Mas há mais: um outro contrato de cinco anos para a prestação de serviços de handling à TAP (também acionista), pagos acima do mercado e que correspondia a mais de 70% da totalidade da faturação. Só em 2017, seis anos depois, é que Alfredo Casimiro paga €3,7 milhões pelo controlo na Groundforce. Fá-lo com os €30 milhões de lucros auferidos entre 2012 e 2019.
O leitor, decerto, já notou algumas semelhanças e pensa que nada disto são coincidências.
Em 2015, o mesmo Governo, através de Pires de Lima, Sérgio Monteiro e a assinatura de Miguel Pinto Luz, atual vice-presidente do PSD, engendram a privatização da TAP no maior obscurantismo imaginável. Depois de “cuidadosamente cozinhado” antes das legislativas, a privatização de 61% da consumou-se a 12 de novembro, dois dias após o programa de Governo de PSD-CDS ter sido chumbado na AR.
A narrativa, que perdura, faz chorar as pedras da calçada: a TAP precisava de dinheiro para pagar salários e o Estado estava obrigado a privatizar. Nada mais falso porque, nessa altura, o Estado já tinha cumprido o valor total de privatizações exigido no memorando da troika e, quanto às necessidades de liquidez, o formato da operação desmente totalmente esta tese e, sobretudo, revela a incapacidade de satisfazer o objetivo. Vejamos.
Qualquer cidadão que tivesse um contacto privilegiado na Airbus e informação interna da TAP poderia, à época, tornar-se dono da companhia portuguesa, seguindo as orientações do Governo de direita. Explico: O Governo PSD-CDS entregou a TAP à Atlantic Gateway, consórcio de David Neeleman e Humberto Pedrosa. Aquele, um conhecido empresário do sector, estabeleceu com a Airbus um peculiar contrato: assumiu que tomaria conta da companhia portuguesa e a faria desistir de uma encomenda de 12 aviões A350 e, em contrapartida, o consórcio europeu pagaria a Neeleman €226 milhões. Ao mesmo tempo, assumiu, também em nome da TAP, que encomendaria novos aviões, designadamente A321 LR, e que estes seriam comprados acima do preço médio de mercado, num valor calculado de €218 milhões.
Com estas operações, validadas então pelo Governo, o empresário encontra o financiamento de que precisava para comprar a TAP. A particularidade é que o faz com o dinheiro da TAP. Já Alfredo Casimiro comprara a Groundforce, e só a pagou seis anos depois, com o dinheiro lucrado com a companhia que Miguel Relvas entregou.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico