Manifesto contra a corrupção e o populismo
A corrupção de agentes públicos é um crime intolerável numa sociedade democrática, ainda mais intolerável do que a cultura de “favorzinho” ou a corrupção no setor privado.
Mas a mensagem populista de que os políticos nunca fizeram nada para combater a corrupção também é um perigo para a democracia. E é uma inverdade. Basta consultar a lista do Banco Mundial dos países que, no Mundo, melhor controlam a corrupção e ver o lugar que Portugal ocupa.
É certo que muito há a fazer. Mas também muito já foi feito. Recordarei apenas alguns factos. Para dotar o país de meios de luta contra a criminalidade económico-financeira, Vera Jardim criou, em 1999, o DCIAP, o TCIC (vulgo “Ticão”) e dotou a PGR de um Núcleo de Apoio Técnico.
Para facilitar a prevenção e repressão da corrupção, António Costa fez aprovar, em 2001/2002, um pacote legislativo que criminalizou o recebimento indevido de vantagem, permitiu a quebra do sigilo bancário, inverteu o ónus da prova em relação à proveniência do património (em caso de condenação) e determinou a perda a favor do Estado do património incompatível com os rendimentos.
Em 2010, aumentou-se o prazo de prescrição dos crimes de corrupção de 5 para 15 anos. Em 2019, o Pacote da Transparência introduziu o crime autónomo de rendimento não declarado dos titulares de cargos públicos, de forma a tornar conforme à Constituição o tão pretendido crime de enriquecimento injustificado. O problema não é falta de legislação penal, embora esta possa e deva ser melhorada para ser implementada com maior eficácia.
É muito mais vasto. Daí a Estratégia Nacional Contra a Corrupção do Governo ter uma abordagem holística para ir às raízes do problema, apostando na prevenção e redução da corrupção e atuando sobre a sua dimensão social e cultural. É esta a razão de ser de muitas medidas aí previstas, como os programas de cumprimento normativo para prevenir e detetar riscos de corrupção nos setores público e privado ou a formação, desde tenra idade, sobre a corrupção e seus impactos nefastos, de forma a criar uma cultura de intolerância a este fenómeno, sob as suas mais variadas formas.
Mas também é necessário fortalecer as dimensões da deteção e da repressão. Destaco a importância de uma pena acessória que impedirá políticos condenados por corrupção de serem eleitos ou nomeados por um período até 10 anos, o reforço do “Ticão” com mais juízes ou regras que impeçam megaprocessos, que só contribuem para a morosidade da justiça e minam a confiança dos cidadãos.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico
Fonte: Constança Urnano de Sousa, Jornal de Notícias, 21 de abril de 2021