
Eurico Brilhante Dias: “Pensionistas? O Governo foi muito transparente!”
Entrevista do Presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, Eurico Brilhante Dias, ao podcast ‘Irrevogável’ da Revista Visão
Deputado eleito por Leiria, antigo secretário de Estado da Internacionalização nos dois primeiros governos de António Costa, Eurico Brilhante Dias, 50 anos, é licenciado em Gestão, doutorado em Ciências Empresariais e professor universitário. Exerce atualmente o cargo de presidente do Grupo Parlamentar do PS, na Assembleia da República.
Que balanço faz da sua experiência enquanto líder parlamentar do PS? Quais foram os piores e os melhores momentos?
Tem sido uma experiência muito boa. Para quem gosta de política, o Parlamento é um sítio fantástico. O melhor momento foi aquele em que chumbámos a moção de rejeição ao programa do Governo, apresentada pelo Chega. Diria que a aprovação do Orçamento do Estado também foi um momento central. E, para o grupo parlamentar, foi a apresentação da Lei das Ordens. O momento mais difícil foi durante a discussão na especialidade do Orçamento do Estado, quando tive de defender uma posição do grupo parlamentar e todos os grupos da oposição estavam contra.
Deteta mais crispação neste Parlamento?
Fui deputado no início da Geringonça, e a crispação estava presente. Tivemos momentos muito tensos. Recordo, por exemplo, a votação da moção de rejeição ao XX Governo Constitucional, o segundo governo de Passos Coelho, a sensação de eletricidade que andava no ar… Atualmente, existe uma tensão que é gerada e alimentada pela extrema-direita parlamentar e que tem de ser gerida com muito cuidado e saber.
Os grupos parlamentares que apoiam o Governo passam a sensação de “caixa de ressonância”… É uma leitura injusta?
A autonomia do grupo parlamentar é manifestada todas as semanas. Mas nós temos um mandato, e esse mandato está assente num programa eleitoral que foi votado pelos portugueses. A maioria absoluta é um programa de Governo com base no programa eleitoral. Não nos peçam para ter outro programa, porque isso não faz sentido.
Em termos comparativos com outros partidos mais pequenos, há uma menor produtividade legislativa…
Em número de iniciativas aprovadas, o grupo parlamentar do PS baterá quase todos os outros. Temos uma responsabilidade: eu não posso apresentar iniciativas legislativas que não sejam aprovadas. Vamos ter o debate orçamental dentro de um mês, e o Parlamento vai analisar umas mil propostas de alteração. Muitas serão inexequíveis. Naturalmente, os grupos da oposição querem sinalizar as suas propostas políticas. O grupo parlamentar do PS não só tem a responsabilidade de dar seguimento às propostas de execução do Governo como a de apresentar projetos de lei e de resolução que façam sentido.
Existe algum canal de comunicação especial com o seu homólogo do PSD?
Tive uma excelente relação com o professor Paulo Mota Pinto, que permitiu que o arranque desta legislatura fosse estável. Há muito tempo que não se resolviam tão rapidamente alguns problemas que tínhamos em cima da mesa, como a designação de membros para alguns órgãos em que PS e PSD têm de se entender; fizemos uma lista conjunta para o Conselho de Estado e para a Mesa. Fizemos um trabalho que teve correspondência na votação final de alguns diplomas apresentados em julho e continuamos a trabalhar noutros documentos agora com o professor Miranda Sarmento e com os outros partidos da oposição. O professor Miranda Sarmento tem menos experiência do que o deputado Paulo Mota Pinto, mas naturalmente que temos de perceber que PS e PSD têm mais de quatro quintos dos deputados desta Assembleia.
O PS veria como útil uma revisão constitucional?
Estamos em período de revisão ordinária, mas devo dizer que não excluímos à partida um processo de revisão constitucional que resolva algumas questões. Não vou ocultar que esse processo, entre o fim da última legislatura e o início desta, está muito marcado por algumas iniciativas do partido de extrema-direita parlamentar, o que não é seguramente a melhor forma de abordar a questão. Mas também há outras matérias em que o PS tem tido posições muito claras, nomeadamente quanto à revisão do sistema eleitoral, e em que o PSD tem tido posições diferentes. Portanto, a abertura de uma revisão constitucional pode resolver algumas questões…
Nessa área, da lei eleitoral?
Precisaria da evolução da posição de alguns partidos, particularmente do PSD. O PS continua a considerar que a redução do número de deputados não é necessariamente útil para ter um sistema eleitoral mais equilibrado, por questões de representatividade e de proporcionalidade de alguns territórios. Não significa isto que nós próprios não tenhamos avançado e não admitíssemos que há formas mais inteligentes de ter uma associação entre o deputado eleito e a representação do círculo eleitoral. Levantou-se também uma questão que a lei dos metadados (atualmente, na especialidade) não vai resolver, porque há limites constitucionais e questões muito pontuais em torno da lei de enquadramento orçamental que têm vindo a ser suscitados pela quinta comissão e que temos de estudar com mais cuidado.
Há algumas vozes, nos pequenos partidos, mais vocais, mais exuberantes e mais experientes do que a sua ou a do seu colega do PSD. É difícil esse combate tribunício?
Não menosprezem os professores… Temos muitas horas a falar para públicos exigentes. E digo isto também em defesa do deputado Miranda Sarmento. Não menosprezem todas as horas de aulas que demos junto de um público muito exigente, no ensino superior. Já temos uns anos disto. Gritar não chega. É preciso explicar, e acho que os professores, aí, têm uma vantagem: somos treinados e temos experiência a explicar.
Então, vamos ver se conseguimos ter uma explicação sua para esta polémica com duas versões completamente diferentes sobre a questão dos pensionistas. Afinal, estão a ser enganados ou não?
A intenção de enganar é manifestamente injusta neste caso, porque enganar seria o Governo não ter sido completamente transparente sobre a forma como vão evoluir as pensões até 2023, e o Governo foi claro: senhores pensionistas, as vossas pensões serão integralmente pagas, mais 8% – metade em outubro e o resto até dezembro de 2023. A questão que se coloca a partir daí… 2025, 2026… Entendemos que é mais razoável gerar flexibilidade orçamental para 2023 e analisar a forma como vamos aumentar as pensões em 2024. Temos uma inflação muito significativa este ano (que se prevê que diminua em 2023), quando tivemos anos a dizer que o novo normal era não haver inflação…
E o senhor está a dizer que, mesmo nesse quadro, os pensionistas foram aumentados.
Os pensionistas foram aumentados acima da fórmula, durante seis anos. O meu ponto é dizer que, perante esta anormalidade, o Governo deve estudar muito bem os impactos que isso tem na sustentabilidade da Segurança Social, de forma a proteger as próprias pensões. Em janeiro de 2024, ninguém vai receber menos nominalmente do que em dezembro de 2023. Não consigo perceber onde está o engano.
Se a regra da aplicação automática do cálculo fosse cumprida, os pensionistas teriam aumentos na casa dos 7%, e o aumento para 2024 seria nessa base. Só depois da discussão que se gerou é que o Governo veio falar da sustentabilidade do sistema.
Está a ser um bocadinho injusto com o senhor primeiro-ministro, porque ele não terá dito “sustentabilidade da Segurança Social”, mas falou de futuro. O Governo, quando antecipa e vai buscar dinheiro à margem orçamental para dar esta meia pensão – e eu não gosto da expressão “dar” –, antecipa o combate aos efeitos da inflação.
Neste pacote, não existem medidas fiscais dignas desse nome…
Estamos numa emergência e tínhamos de responder a uma realidade concreta e não a um elemento estrutural, porque isso não faz sentido num quadro de volatilidade. Nos combustíveis, não podemos viver o resto da vida sem uma taxa de carbono. As medidas devem ser conjunturais, e temos depois um Orçamento do Estado a discutir onde, no quadro fiscal, teremos de incluir questões sobre o IRS. O Governo respondeu bem.