

Alterações ao OE? Só “o mais neutrais possível”
Entrevista da vice-presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista Jamila Madeira ao Negócios.
O PS defende que a proposta de Orçamento é para manter como está e que a situação ainda não justifica novas medidas para famílias ou empresas. No futuro se verá, diz a vice da bancada, Jamila Madeira.
O PS parte para a discussão da proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2022 com abertura, mas traça várias linhas vermelhas. Para Jamila Madeira, os impactos da guerra são, para já, limitados e, por isso, as medidas do OE chegam. Assim, a vice-presidente da bancada do PS avisa que a disponibilidade para propostas de alteração existirá sobretudo para medidas sem impacto orçamental. Se a situação internacional piorar, Governo não deixará de responder, garante.
Com que abertura é que o PS parte para a discussão na especialidade do OE?
Dissemos em campanha eleitoral e depois do resultado que estaríamos sempre disponíveis para fazer pontes dialogantes, no sentido de melhorar as propostas e de incorporar as linhas políticas da mesma tendência deste OE. Esse espírito dialogante existe e existirá perante as propostas que a oposição apresentar, que serão avaliadas em linha como espírito do 0E.
Que postura espera dos partidos da oposição?
Que se preocupem com as linhas que temos em cima da mesa. Temos enormes desafios… Viemos de uma pandemia e agora incorporamos um novo desafio, que são todas as dinâmicas associadas à guerra na Ucrânia. Mas temos que manter um enorme espírito de responsabilidade e rigor. Queremos continuar a reforçar o Estado Social e queremos continuar a dar respostas para melhorar a qualidade de vida das pessoas, para apoiar as famílias. Mas temos de o fazer com contas certas. Essas contas certas são muito críticas em momento de instabilidade ou de incerteza. Não sabemos se haverá mexidas nas taxas de juro, quando há retoma das regras orçamentais europeias…
Há pelo menos um ano até Bruxelas decidir.
Nós não sabemos quanto tempo. O que sabemos é que o peso da dívida pública em Portugal é grande. Quando nós enfrentarmos esta nova análise da Comissão Europeia queremos poder dizer que, obrigatórias ou não, nós cumprimos e isso dá credibilidade à nossa economia. Sabemos que a sustentabilidade das contas públicas se constrói nos momentos de alguma prosperidade, para que nos momentos de dificuldade e necessidade, como houve na pandemia, injetar recursos na sociedade…
Para o PS este não é um momento de emergência, de abrir os cordões à bolsa?
Foi isso que o Governo fez na pandemia e tem sido feito agora. Não podemos é pôr em causa a sustentabilidade desse mesmo Estado Social. Por isso, o ponto de equilíbrio entre prudência e ambição é algo muito desafiador neste OE.
Dentro desta preocupação de consolidação das contas, o PS acredita que não é possível ir além das medidas que já estão em cima da mesa?
As medidas de apoio, de reforço do apoio às famílias e às empresas, previstas no OE são muito transversais e que têm um impacto tremendo na vida, no dia a dia das pessoas. Com isso nós não estamos alheios ao que se está a passar. Agora são medidas que temos que ir avaliando ao longo do processo, porque o que sabemos, e até agora todas as entidades nacionais e internacionais vão nesse sentido, é que este efeito [de subida nos preços] é razoavelmente circunscrito [no tempo]. Temos que avaliar para que não se contamine todo processo de crescimento com uma crise que acreditamos que é ainda bastante circunscrita.
O que é que seria um sinal de alerta para avançar com mais medidas de apoio?
Cabe ao Governo definir um conjunto de elementos que podem ser avaliados, mas que terão de ser monitorizados a par e passo. Isso permite uma enorme flexibilidade e um ajuste permanente. E eu acho que este OE dá essa flexibilidade e garante que estamos todos alerta para ajustar, para ajustar a realidade consoante a evolução dos factos.
O PS admite uma atualização dos escalões de IRS à inflação?
Os instrumentos de ajustamento salarial e de rendimentos das famílias que o Governo pôs em prática desde 2015 foram sempre tendo em conta o reflexo do ano anterior. Ainda assim, houve um ajuste – que não é integral, como é dito pela oposição – com a introdução destes efeitos de mitigação. De qualquer forma, esses ajustes serão tidos em conta na altura própria, quando estivermos perante uma realidade mais severa.
Então o PS também não vai propor, nem aprovar, uma nova atualização dos salários da função pública à inflação.
A proposta que está em cima da mesa é esta. Tudo o resto depende da evolução e seguirá esta mesma linha de tendência: uma premissa de negociação salarial na base sindical. Quando falamos da Função Pública, conhecemos aquilo que está negociado e no quadro do referencial de 2021 é isso que está em cima da mesa.
A inflação em 2021 acabou por ser maior do que 0,9%.
O que nós estamos aqui a falar é do referencial que podemos ter na negociação. Isso não significa que as próximas abordagens não possam trazer outras coisas. E depende muito da evolução da conjuntura.
Quando fala em próximas abordagens…
Da negociação sindical tudo pode sair.
Admitem alargar no tempo a prestação de 60 euros para as famílias mais vulneráveis?
Na pandemia, as medidas do lay-off, de apoio a famílias até 100%, não estavam vertidas no OE e foram sempre possíveis. Se esta situação for mais permanente, esta ou outras medidas poderão ser avaliadas. Não considero que o próximo mês seja o mês derradeiro para todas elas serem incorporadas.
O que está a dizer é que novas medidas não precisam de entrar já, mas que o OE tem margem para elas.
Na pandemia, a margem – margem entre aspas – que houve foi à custa de dívida pública, mas nunca deixando ninguém para trás. E aqui o mesmo. Não é que haja margem, no sentido de que há aqui urna folga e agora não estamos a defini-la por não querer. Será sempre prejudicial para o equilíbrio que se quer, mas nunca deixaremos ninguém para trás.
Das suas respostas parece resultar que há várias linhas vermelhas traçadas. A disponibilidade para negociar está então onde?
Apresentamos agora esta proposta, já com um conjunto de outras medidas, e é preciso ambição e prudência. E é neste equilíbrio que todas as propostas que salvaguardem estas premissas, que não comprometam o presente nem o futuro, serão vistas e acolhidas.
A disponibilidade estará em propostas neutrais do ponto de vista orçamental?
O mais possível neutrais, claro. E ainda mais perante o conjunto de incertezas que temos à nossa frente é de facto essencial.
Leia aqui o original.
“Neste momento não se coloca um reforço do orçamento da Defesa”
Marcelo pediu mais investimento para a Defesa e o PSD já anunciou que vai apresentar propostas de alteração ao OE nesse sentido, mas devem cair em saco roto. Para já, o PS não considera que tal seja necessário.
A vice-presidente da bancada do PS para a área financeira não levanta o véu sobre as propostas de alteração do partido ao Orçamento do Estado (0E), mas já sabe onde não haverá mudanças, caso do orçamento para a Defesa – em que Marcelo pediu mais investimento.
O PS vai propor um aumento do orçamento para a defesa, como sugeriu o Presidente da República?
O senhor ministro [das Finanças] deixou bem claro que não deixaremos de assimilar responsabilidades que venham a ser potencialmente assumidas no quadro das organizações internacionais em que participamos, nomeadamente da NATO, se tal questão se colocar. Neste momento não se coloca. E portanto não vale a pena antecipar algo que não sabemos sequer se se vai colocar.
Em relação às empresas, o OE tem o incentivo fiscal à recuperação mas só meio ano. Considerariam a hipótese de alargar, permitindo que investimentos feitos até junho também fossem elegíveis?
Mais uma vez, vai ter a ver com os indicadores económicos, mas julgo que, perante todos os indicadores que a economia está a promover, é difícil neste momento dizer que se justifica. Teremos de avaliar. Mas este é um instrumento muito poderoso, de enorme impacto nas empresas e na sua estrutura contabilística.
Tal como está a proposta de OE, as empresas que na primeira metade do ano tenham feito despedimentos ou distribuído dividendos já não poderão beneficiar do incentivo. O PS pensa propor alguma alteração a esta regra?
Não consigo antecipar, por agora. Ainda vamos começar audiências, no âmbito da especialidade.
A habitação é um dos temas do momento, mas as medidas em curso terão reflexos mais a longo prazo. Para o imediato, o PS tem propostas?
O facto de a opção terem sido as estratégias locais de habitação, com os municípios, faz com que haja respostas a múltiplos níveis. Houve municípios que estruturaram num circuito de aquisição de imóveis devolutos, colocando-os ao dispor das famílias, nalguns casos com reabilitações, mas no imediato, e noutros casos construção própria, isso sim mais moroso.
Portanto, também não têm prevista nenhuma proposta nesta área?
Esta é uma mega proposta. Nunca houve uma estratégia com uma política de habitação como esta, um instrumento financeiro colocado ao dispor para responder a este enorme desafio.
O PS está disponível para prolongar o prazo de licenciamento de empresas na zona franca da Madeira?
Não consigo antecipar. É uma resposta que será dada a seu tempo na especialidade.
O deputado do PS Madeira, Carlos Pereira, afirmou que havia um pré-acordo nesse sentido ao nível da bancada parlamentar.
Até estarem entregues, não há propostas do PS. Não consigo antecipar nada, por enquanto. Já reunimos com os deputados setoriais e regionais, para começarem a ser identificadas propostas, e quando nos chegarem serão avaliadas em conformidade.
Nesta fase o PS já tem alguma proposta de alteração preparada?
Ainda é muito cedo.
A vossa posição é que, com a informação que temos agora, as medidas constantes do OE chegam para acudir a situação?
Criam os instrumentos ao Governo que permitem acudir usando a mesma metodologia de avaliação permanente para, sem criar pressões inflacionistas, ter condições para continuar uma linha de continuidade e de compromisso como assumido.
Na sexta-feira espera que, além do PS, mais algum partido vote favoravelmente o orçamento?
Gostaria de dizer que sim, mas tem de perguntar aos outros partidos. Julgo que o debate ainda é muito precoce, tivemos apenas as duas audições em comissão. O debate inicia-se hoje à tarde e será no decorrer disso que podemos antever sentidos de voto. O PSD já disse que votaria contra. Os demais partidos não disseram nada, mas o debate parlamentar permitirá já interpretar sentimentos e vontade que têm de colaborar na construção de um OE que sirva o país, o seu presente e o futuro.
Leia aqui o original.