A Visita de Macron a Portugal: Entre a Honra e a Desonra
A recente visita do Presidente da República Francesa, Emmanuel Macron, a Portugal foi, sem dúvida, um momento de grande significado político e diplomático. A relação entre Portugal e França é histórica e profunda, entrelaçando-se em laços culturais, sociais e económicos. Durante décadas, milhares de portugueses encontraram em França um refúgio e uma oportunidade para construir uma vida melhor. Hoje, a comunidade portuguesa em França continua a ser uma das mais expressivas e influentes, demonstrando a importância desta ligação entre os dois países.
Num contexto internacional complexo, com desafios que vão desde a política europeia até às tensões geopolíticas globais, a proximidade entre Portugal e França reveste-se de uma importância estratégica inegável. Macron foi recebido com as honras que merece enquanto Chefe de Estado de uma nação amiga e aliada. Este reconhecimento é não apenas justo, mas necessário para a manutenção de boas relações entre os dois países.
Contudo, há um aspeto desta visita que merece uma reflexão crítica: o impacto que teve sobre o funcionamento de um órgão de soberania nacional e a forma como o protocolo foi conduzido. A Assembleia da República viu os seus trabalhos suspensos e adiados devido à receção ao Presidente francês.
O primeiro erro foi o facto de não ter sido criado qualquer momento para um encontro entre Macron e os deputados. Tratando-se da casa da democracia portuguesa, seria natural que o protocolo previsse uma ocasião em que o Presidente francês pudesse dirigir-se aos representantes eleitos do povo português, reforçando os laços institucionais entre os dois países. No entanto, isso não aconteceu, deixando de lado aqueles que legitimamente compõem o Parlamento e que deveriam ter tido um papel mais ativo na receção ao Chefe de Estado francês.
Ora, se os deputados não tiveram qualquer participação institucional relevante nesta visita, não havia qualquer justificação para que o funcionamento da Assembleia da República fosse condicionado. O normal desenvolvimento dos trabalhos legislativos, previamente agendados, deveria ter sido assegurado. O Presidente da Assembleia da República poderia ter delegado a condução dos trabalhos a um dos vice-presidentes, garantindo assim que o Parlamento mantinha a sua atividade sem interrupções nem atrasos.
Ao não o fazer, o Presidente da Assembleia da República não só comprometeu o funcionamento do órgão máximo da democracia portuguesa, como passou um sinal errado sobre a nossa soberania institucional. Quando o próprio líder do Parlamento aceita que a Assembleia fique paralisada perante uma visita de Estado, está, na prática, a diminuir o seu papel e, com isso, a diminuir o próprio país. Portugal deve afirmar-se com dignidade e respeito no plano internacional, e isso começa por garantir que as suas instituições funcionam com a independência e a autoridade que lhes é devida.
Fonte: Gilberto Anjos, 28 de fevereiro de 2025